quarta-feira, 25 de março de 2009

ELUANA

«FAZIA-NOS FALTA UMA CARÍCIA DO NAZARENO»

«A existência é um espaço que nos ofereceram e que devemos encher de sentido,
sempre e seja como for» (Enzo Jannacci, Corriere della Sera, 6 de Fevereiro de 2009).
Mas uma vida como a de Eluana pode-se encher de sentido? Ainda tem significado? A
morte de Eluana não fechou a porta a estas perguntas. Pelo contrário. Não acabou tudo,
como uma derrota da esperança para quem a queria ainda com vida, ou como uma
libertação para quem já não achava suportável aquela situação. Exactamente agora o
desafio faz-se mais radical para todos.
A morte de Eluana urge como um aguilhão: como é que cada um de nós colaborou para
encher de sentido a sua vida, que contributo deu àqueles que estavam mais directamente
atingidos pela sua doença, a começar pelo o seu pai?

Quando a realidade nos põe entre a espada e a parede, a nossa medida não é capaz
de oferecer o sentido de que temos necessidade para avançar. Sobretudo, diante de
circunstâncias dolorosas e injustas, que não parecem estar destinadas a mudar ou a
resolverem-se, vem-nos a pergunta: que sentido tem? Será a vida talvez um engano?
O sentido de vazio avança, se ficamos prisioneiros da nossa razão reduzida a medida,
incapaz de suportar o embate da contradição. Encontramo-nos perdidos e sozinhos com
a nossa impotência, com a suspeita de que no fundo tudo é nada.
Podemos «encher de sentido» uma vida quando nos encontramos diante de uma pessoa
como Eluana? Podemos suportar o sofrimento quando supera a nossa medida? Sozinhos
não somos capazes. É preciso embater-se na presença de alguém que experimente como
cheia de sentido aquela vida que nós ao contrário vivemos como um vazio devastador.

Nem sequer a Cristo foi poupado o pavor da dor e do mal, até à morte. Mas o que é
que n’Ele fez a diferença? Era melhor do que nós? Tinha mais energia moral do que
nós? Não, a tal ponto que no momento mais terrível da prova pediu para que Lhe fosse
poupada a cruz. Em Cristo foi derrotada a suspeita de que a vida fosse em última análise
uma derrota: venceu a Sua ligação ao Pai.
Bento XVI recordou que para esperar «o ser humano necessita do amor incondicionado.
Precisa daquela certeza que o faz exclamar: “Nem a morte nem a vida…, nos poderá
separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus” (Rom 8, 38-39). Se existe este amor
absoluto com a sua certeza absoluta, então – e somente então – o homem está
«redimido», independentemente do que lhe possa acontecer naquela circunstância.»

A presença de Cristo é o único facto que pode dar sentido à dor e à injustiça.
Reconhecer a positividade que vence cada solidão e violência só é possível graças ao
encontro com pessoas que testemunham que a vida vale mais do que a doença e a morte.
É o que foram para Eluana as irmãs que a acudiram por tantos anos, porque como disse
Jannacci, também hoje «fazia-nos falta uma carícia do Nazareno, teríamos assim tanta
necessidade de uma sua carícia», daquele homem que há dois mil anos disse, voltando-
se para a viúva de Naim: «Mulher, não chores!».

Comunhão e Libertação
10 de Fevereiro de 2009